O Ministro de Confissão religiosa como sujeito passivo de obrigação tributária.

Autora: Lorraine Carla Vieira Nascimento[1].

O Código de Direito Canônico (CIC) normatiza no cân. 281[2] o direito natural dos clérigos, que se dedicam ao ministério eclesiástico, de receberem uma remuneração digna, que consiga prover às suas necessidades pessoais e uma assistência social que atenda convenientemente o seu sustento nos casos de enfermidade, invalidez ou velhice.

Aplicando este direito ao disposto na legislação brasileira, é assente o entendimento de que o ministro ordenado, ao receber sua côngrua ou espórtula, aufere renda, tornando-se, portanto, sujeito passivo da obrigação tributária, como qualquer outro contribuinte[3].

Isso porque a imunidade tributária conferida aos templos religiosos não é extensível aos ministros de culto[4], ou seja, as pessoas físicas, mas apenas as pessoas jurídicas expressamente constituídas como “templos de qualquer culto”, na forma da Constituição Federal[5].

Como consequência deste entendimento, os valores recebidos pelos ministros religiosos estão sujeitos à incidência do Imposto sobre a Renda na Fonte (IRRF), visto que não gozam de imunidade ou isenção, exceto se, obviamente, os valores pagos estiverem dentro do limite de isenção da tabela progressiva do IRRF[6], conforme determina o Regulamento de Imposto de Renda[7].

Compete a fonte pagadora, ou seja, a Igreja, informar à Receita Federal, por meio do E-Social, os valores mensais repassados aos seus “ministros de confissão religiosa” e realizar a retenção e o recolhimento do imposto de renda, salvo nos casos em que os valores pagos estejam dentro do limite de isenção da referida tabela.

Constitui, portanto, uma obrigação acessória[8] da Igreja informar, reter e recolher o imposto de renda sobre os valores repassados aos seus ministros. O descumprimento dessa obrigação, além de constituir crime tributário, transfere para o ente eclesiástico a responsabilidade pelo pagamento do imposto, incidindo correção monetária, juros e multa para valores recolhidos em atraso, além de eventuais penalidades pecuniárias.

É importante ainda ficar atento para o fato de que os benefícios pessoais recebidos em dinheiro ou por meio de custeio de plano de saúde[9] ou da contribuição previdenciária individual se somam à base de cálculo do imposto de renda. Assim, caso a entidade religiosa opte por realizar o pagamento do plano de saúde e da previdência social de seus sacerdotes, deverá ficar atenta em somar todos os valores para fins de incidência do IRRF.

Bom lembrar que o ministro de confissão religiosa ou membro de instituto de vida consagrada ou sociedade de vida apostólica são segurados obrigatórios[10] da Previdência Social, qualificados como contribuintes individuais, em relação ao valor recebido para o exercício de seu mister religioso.

Desta forma, do valor recebido, caberá ao próprio ministro, como contribuinte individual, o recolhimento da sua contribuição, que corresponderá a 20% sobre o valor por ele declarado, observados os limites mínimo e máximo de salário de contribuição.

Como não existe qualquer tipo de vínculo empregatício entre o ministro de confissão religiosa e a instituição religiosa[11], essa não tem a obrigação de recolher a previdência social de seus membros e se assim o fizer, como já dito, será considerado como benefício pecuniário e deverá constar na base de cálculo do imposto de renda.

Concluindo, respeitadas as opiniões contrárias, é consolidado na legislação, na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que as côngruas pagas a sacerdotes diocesanos correspondem exemplo típico de renda tributável.

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[1] Mestranda em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Gregoriana. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Estado de Goiás. E-mail: [email protected].

[2] Cân. 281 § 1. Os clérigos, quando se dedicam ao ministério eclesiástico, merecem uma remuneração condizente com sua condição, levando- se em conta, seja a natureza do próprio ofício, sejam as condições de lugar e tempo, de modo que com ela possam prover às necessidades de sua vida e também à justa retribuição daqueles de cujo serviço necessitam. § 2. Assim também, deve-se garantir que gozem de previdência social tal, que atenda convenientemente às suas necessidades, em caso de enfermidade, invalidez ou velhice.

[3] Solução de Consulta da Receita Federal n. 254/2017.

[4] Decreto n. 9.580/2018, Art. 178.

[5] CRFB, Art. 150, inciso VI, alínea “b”.

[6] Decreto n. 9.580/2018, Art. 677.

[7] Decreto n. 9.580/2018, Art. 775.

[8] Decreto n. 9.580/2018, Art. 182.

[9] Solução de Consulta da Receita Federal n. 87/2021.

[10] Lei nº 8.212, de 1991, §§ 13 e 14 do art. 22.

[11] Art. 16, Decreto n. 7.107, de 2010.